quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Crise de meia idade

Ela tem alturas da vida em que lhe apetece ser um mensageiro de luz, encontrar-se e ficar consciente de quem é na realidade. É então que lhe dá para se virar para o misticismo, quer tentar ficar mais perto de Deus, se é que Ele existe e tenha Ele a forma que tiver, ela gosta de acreditar que Ele tem a sua maior plenitude na Natureza, no mar, na terra, nas flores e nas árvores.
Então faz o que leu algures num livro, tenta ver todos os lados positivos da vida e acaba por concluir coisas tão tristes como o facto de não ter uma vida.

Tenho trabalho – Depois de 5 anos de um curso de economia que esgotou financeiramente os seus pais, depois de ter já sido responsável pela área financeira da empresa onde se encontra, mas arriscou ter um filho, quando voltou viu-se atirada para a recepção.

Tenho ordenado – Ganhava há 2 anos atrás cerca de 1.400 euros, era um ordenado que lhe permitia até ter algumas excentricidades, como ter mulher a dias, agora é uma recepcionista muito bem paga nos seus 900 euros, o restante foi-lhe retirado porque depois de ser mãe iria ter horário reduzido, logo não precisava de isenção de horário.

Tenho uma casa – 150 mil euros empatados numa casa que nunca será sua, daqui a 40 anos quando terminar a sua dívida ao banco, a casa não vai valer nem o valor do terreno e é até provável que seja o seguro a terminar os pagamentos, pois ela estará morta.

Tenho um marido – Depois de uns anos de convivência a dois as prioridades alteraram-se, deixaram de ser suficientes para se bastarem, deixaram de ser eles contra o mundo, passaram a estar quase sempre um contra o outro. Os seus objectivos deixaram de ser os “nossos”, passaram a ser os “meus” e os “teus”, afastaram-se, distanciaram-se tanto que por vezes ela chega a ter saudades dos olhos dele, nos dela.

Tenho amigos – Alguns não os vê desde que saiu da faculdade, outros desiludiram-na, traíram-na. Há uns poucos que se mantêm e até lhe mandam uns emails de vez em quando, esses são os bons, os presentes, aqueles com que ela sabe que pode contar, quanto mais não seja, do outro lado do monitor.

Na crises existenciais, em que repensamos os nossos objectivos de vida, em que pesamos as coisas boas que temos e as coisas a que por vezes damos pouco valor, apercebemo-nos que sobrevivemos quando podíamos ter tanto mais da vida, se tivéssemos a coragem de nos mudar e pensar em nós como sendo um grão de areia no Universo, que pode ser importante se encravar a engrenagem e tentar dar um novo alento à “nossa” vida, tentando assim atingir a felicidade.

Sem comentários: